João Amorim e Baird trabalharam com “fúria” e dia e noite para articular a queda de Bernal

Descontentes com a suspensão e redução de repasses para suas empresas, os empresários João Amorim e João Roberto Baird, o Bill Gates Pantaneiro, trabalharam com “fúria” e dia e noite para articular da queda de Alcides Bernal (PP). Ao longo da sentença de 415 páginas, publicada na madrugada desta quinta-feira (3), o juiz Ariovaldo Nantes Corrêa, descreve em detalhes as manobras, junto com o pastor Gilmar Olarte (sem partido), para pagar propina, cooptar vereadores e mudar os rumos políticos da Capital. “Esta ação de improbidade administrativa proposta no ano de 2016 revela como empresários se utilizam da relação com servidores públicos, agentes públicos e, sobretudo, com agentes políticos para obterem benefícios às custas do erário, bem como a presença cada vez maior e explícita de organizações com práticas ilícitas junto às instituições do Estado”, lamenta o magistrado. Veja mais:Bernal celebra condenações e espera pressão de poderosos com “tentáculos por todos os lados” Coffee Break: juiz condena vereador, empresários poderosos, ex-secretário e dono de jornal Juiz absolve André, Nelsinho, três vereadores secretário de Fazenda e autores de impeachment Enrolados em escândalos de corrupção nos últimos 30 anos, apesar da repercussão e do horror causado na sociedade, os empresários sempre conseguiram sair ilesos na Justiça de Mato Grosso do Sul. Amorim chegou a ser condenado no escândalo do lixo, de que teria pago propina para o ex-cunhado, o senador Nelsinho Trad (PSD), mas o Tribunal de Justiça anulou a sentença e manteve o empresário como a mais inocente das criaturas. As provas contra Amorim e Baird começaram a ser coletadas pela Polícia Federal em 2013 com a Operação Pilar de Pedra, a origem da Lama Asfáltica. Em interceptações telefônicas, o empresário cobrava o então presidente da Câmara, Mário César de Oliveira (MDB), o pagamento das prestações para a Solurb, empresa da qual não é sócio formal, mas, nos bastidores da política, todos o tratam como um dos verdadeiros proprietários da concessionária do lixo. Corrêa destacou, na sentença, que os vereadores Edil Albuquerque (PTB), Paulo Siufi (MDB) e Ariton Saraiva, foram à tribuna para cobrar os repasses para a Solurb. A deposição de Bernal começou a ser articulada quando ele começou a rever contratos, suspendeu repasses, realizou auditorias e rompeu contratos. A reação da organização criminosa “A prova colhida mostra que os requeridos João Alberto Krampe Amorim dos Santos, João Roberto Baird e Gilmar Antunes Olarte, diretamente ou por interpostas pessoas, dentre as quais os requeridos Mário Cesar Oliveira da Fonseca, Fábio Portela Machinsky e José Airton Saraiva, unidos pela identidade de desígnios e agindo consoante as diretrizes da associação criminosa, ofereceram, cada a qual a seu modo, vantagem indevida a funcionários públicos, no caso aos vereadores de Campo Grande Paulo Siufi Neto, Edil Afonso Albuquerque, Jamal Mohamed Salem e José Alceu Padilha Bueno, para que, ao atuarem na qualidade de julgadores da comissão processante instalada na câmara de vereadores deste município para cassar o prefeito Alcides Jesus Peralta Bernal, votassem favoravelmente à cassação, como de fato votaram, com infração de seus deveres funcionais de julgar com isenção e imparcialidade, sendo que foram movidos por seus interesses pessoais nas vantagens que lhes foram prometidas ou oferecidas”, relata o juiz. “O que moveu João Alberto Krampe Amorim dos Santos e João Roberto Baird foi a necessidade de verem restaurada a dominação político-empresarial ao mesmo grupo que, depois de anos de incontestável hegemonia, foi retirado da ingerência sobre os recursos públicos da administração municipal, garantindo a eles o restabelecimento de privilégios junto à administração pública municipal, tais como a continuidade dos contratos de seus interesses e suplementações orçamentárias elevadas, além do fato de que a administração de Alcides Bernal teria colocado em questionamento os contratos realizados pelas administrações anteriores”, pontuou. “Como se vê, portanto, a atuação do requerido João Amorim compreende toda a trama narrada na inicial, isto é, desde os atos preparatórios para deposição do então prefeito eleito até a formação da nova administração sobre a qual teve inegável influência”, destacou. No tablet de Tereza Cortada Pedrossian Amorim, esposa de João Amorim, a PF encontrou mensagens em que ela descreve a obstinação do marido em derrubar Bernal. “’J.A vem trabalhando com fúria p mudar o rumo político da Prefeitura. Não tem hora nem limite p conseguir seu intento’ e que ‘Já são 8:30 da noite e J.A. está no escritório de Girotto planejando a queda do Bernal e suas implicações em sua vida profissional’”, afirmou a empresária. O político e o pastor, a aliança entre Mário César e Olarte para derrubar Bernal e chegar ao poder na Capital (Foto: Arquivo) Cafezinho A propina foi substituída pelo termo “cafezinho”, que era servido pela sócia e secretária de João Amorim, Elza Cristina Araújo dos Santos. Conforme o Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado), era comum ela chamar políticos e empresários envolvidos na cassação de Bernal para o “cafezinho”. Durante os trabalhos da CPI do Calote e da Comissão Processante, João Amorim sacou R$ 500 mil da conta pessoal para “distribuir” entre os vereadores. Eles trabalharam até a véspera da votação da cassação de Bernal, na noite do dia 12 de março de 2014, para garantir os votos necessários. Eles tinham 23 votos e trabalharam para conquistar o 24º, que viria da negociação com o ex-deputado estadual José Almi Pereira, o Cabo Almi (PT), que recusou a oferta. Já o Bill Gates Pantaneiro fez dois repasses para Elza Cristina, de R$ 228 mil e R$ 80 mil, para oferecer “cafezinho”. Até dono de jornal apareceu para tomar o cafezinho. Elza até o alertou que o “café estava fraco”. O COAF, o xerife do sistema financeiro, encontrou o depósito de R$ 155 mil na conta do dono do Midiamax, Carlos Naegele. Ele negou a acusação e disse que o dinheiro era proveniente da venda de gado. “Diante das provas até aqui apontadas, portanto, comprovado está que o requerido João Alberto Krampe Amorim dos Santos exerceu um papel central na arquitetura da cassação do prefeito eleito Alcides Bernal por meio do oferecimento de vantagens indevidas aos vereadores a fim de que votassem favoravelmente ao seu impedimento, sendo que posteriormente à ascensão do vice-prefeito ao posto de Chefe do Executivo passou a exercer influência para que suas empresas voltassem a ser beneficiadas pelos cofres públicos”, concluiu o juiz Ariovaldo Nantes Corrêa. A Copeira: Elza Cristina era responsável por pagar a propina, que era chamada de “cafezinho” (Foto: Arquivo/Marcos Ermínio/Campo Grande News) Prefeito “oculto” Com a posse de Gilmar Olarte, João Amorim passou a ter poderes de nomear e elevar aditivos no município. O juiz destacou que ele emplacou o procurador da Câmara, André Luiz Scaff, conhecido como “vereador sem voto”. Também chegou a ser gravado oferecendo emprego para outras pessoas. “Alcançada a deposição do prefeito eleito, o requerido João Alberto Krampe Amorim dos Santos passou então a atuar para obtenção das vantagens por ele visadas com o restabelecimento da estrutura de poder em que estava anteriormente inserido, como o favorecimento financeiro de suas empresas por intermédio dos contratos que possuía com o poder público municipal, que se dava por meio do recebimento de elevados pagamentos, suplementação orçamentária e aditivos das avenças”, destacou. A Proteco, empresa em que aparece como dono de fato, conseguiu aditivo de quase R$ 1milhão. A LD Construções, em nome do genro Luciano Poltrich Dolzan, teve quatro aditivos, que elevaram os contratos em R$ 2,201 milhões – o valor atualizado pela inflação oficial seria de R$ 4 milhões. Além disso, houve várias suplementações para pagar a Solurb, da qual também Amorim seria sócio oculto, que passou a ter prioridade sobre outras áreas. As condenações João Amorim, Baird e Gilmar Olarte foram condenados a suspensão dos direitos políticos por 10 anos, proibição de firmar contratos com o poder público por uma década e ao pagamento de R$ 250 mil de indenização por danos morais cada um. Eles poderão recorrer da sentença.